segunda-feira, 17 de agosto de 2009

'Acabamento' profissional

Eles não são músicos, nem vocalistas, mas acabam fazendo parte da banda; o trabalho dos produtores está cada vez mais valorizado

A Poléxia contratou o produtor John Ulhoa, do Pato Fu, responsável pela música 'Você Já Teve Mais Cabelo'


Heitor e Banda Gentileza entram no estúdio em julho com o Profeta, que trabalhou com O Rappa e Lenine

A tecnologia facilitou muito o registro e a promoção dos trabalhos das bandas musicais. Hoje em dia, elas se auto gerenciam, divulgam músicas via internet e até gravam discos em casa. No entanto, muitas não abrem mão de trabalhar com um produtor musical, que deixe suas músicas mais aprimoradas e sem perder a essência independente.

Em Curitiba isto pode ser confirmado nos últimos trabalhos de diversos artistas. O pioneiro foi o Terminal Guadalupe, 'descoberto' pelo produtor Tomás Magno, que escolheu o grupo para trabalhar. ''No início, não acreditávamos que alguém do estúdio Toca do Bandido quisesse nos gravar, até porque nem dinheiro tínhamos para isso'', comenta o vocalista Dary Jr. ''No entanto, Tomás estava empolgado com o material que havíamos preparado e tornou o custo da gravação acessível. O resto é história'', completa.

O resultado, o álbum ''A Marcha dos Invisíveis'', levou o TG a tocar de Cuiabá (MT) a Porto Alegre (RS) e a figurar nas principais listas de melhores discos de 2007. O acabamento das músicas empolgou vários artistas da cidade. ''As bandas perceberam que poderiam conseguir um resultado melhor se tivessem o auxílio de um profissional especializado em vez de bancar autoproduções que soam como CD demo. Eu apresentei o Tomás para esses grupos e todos eles estão muito satisfeitos com as gravações'', comenta Dary, que hoje está gravando o EP ''O Tempo Vai Nos Perdoar'' com o veterano Roy Cicala, que já produziu de John Lennon a Frank Sinatra.

Após este episódio, Tomás Magno foi chamado para produzir mais artistas de Curitiba, como Fuja Lurdes, Anacrônica e Sabonetes. Com esta última, gravou um EP no ano passado e está preparando o álbum de estréia para este ano. Seu baixista, Rodrigo Lemos, é integrante da Poléxia, banda que contratou o produtor John Ulhoa, do Pato Fu, responsável pela música ''Você Já Teve Mais Cabelo''.

''Achei muito interessante a maneira que cada um tem de conduzir uma produção; o John gosta de procurar elementos menores dentro da canção para valorizar. Geralmente produz do micro para o macro. O Tomás, por sua vez, possui uma visão macro da música e costuma ir aparando as arestas até ficar só com o essencial'', compara Lemos

Para ele, um olhar ''estrangeiro'' para suas músicas foi de grande contribuição. ''Quando se está muito envolvido, a tendência é perder por completo o senso crítico e a referência que se tinha no começo do processo'', explica.

A Poléxia lança o álbum ''A Força do Hábito'' em breve, enquanto os Sabonetes estão em processo de gravação, assim como o Charme Chulo, que tem o nome de Carlos Eduardo Miranda na produção de seu próximo álbum. ''Ele se interessou e começou o trabalho de produção com a gente'', relata o vocalista Igor Filus.

A moda pegou mesmo. Heitor e Banda Gentileza entram no estúdio agora em julho com o produtor carioca Plinio Profeta (que trabalhou com O Rappa, Lenine e Pedro Luis e a Parede).

''Se uma banda acha que tem um bom trabalho, tem mais é que valorizar. Assim que ganhamos um edital para gravar um disco pensamos na possibilidade de um produtor. Queríamos alguém que já tivesse trabalhado com bandas de peso e brasilidade. Fechamos com o Profeta'', comenta Heitor, que está empolgado com tantos trabalhos bons e bem produzidos na cidade. ''Muitas bandas estão fazendo músicas bem feitas e com potencial de alcance nacional. Este ano será ótimo para Curitiba''.
Terminal Guadalupe: a banda foi 'descoberta' por Magno, que escolheu o grupo para trabalhar


'O que importa é a verdade do artista'

Seja como assistente, engenheiro de som ou produtor, Tomás Magno contabiliza mais de 70 discos na carreira

Depois de sua primeira produção em Curitiba, em 2005, Tomás Magno passou a ser figura frequente na cidade. Natural da Bahia, Tomás passou 11 anos morando no Rio de Janeiro, mudando-se para São Paulo no ano passado. Nestes centros urbanos se envolveu com trabalhos musicais de estúdio ao lado do conceituado Tom Capone. Foi assistente, engenheiro de som ou produtor de álbuns de artistas como O Rappa, Detonautas, Gilberto Gil, Raimundos, Skank, Natiruts, Marisa Monte, Maria Rita, Milton Nascimento, Marjorie Estiano, Barão Vermelho, entre tantos outros, contabilizando mais de 70 discos. Ultimamente tem se dedicado bastante aos artistas independentes.

Folha Hoje, mesmo os artistas mais independentes estão trabalhando com produtores. Por que?

Tomás Essa mudança vem da vontade de se profissionalizar, é o anseio de fazer algo grande. As bandas que já eram melhores resolveram se profissionalizar de vez, e aceitar uma ajuda externa de profissionais que vivem disso.

Folha Você tem sentido essa necessidade só em Curitiba?

Tomás Não é só aqui, mas no País todo. O pessoal está cada vez mais aberto para a ideia do produtor ajudando a banda. Quando o artista contrata o produtor, ele vira um integrante da banda por algum tempo.

Folha Qual a principal vantagem deste trabalho para uma banda emergente?

Tomás É o fato do produtor estar desapegado das músicas e dos arranjos. Com o artista, muitas vezes acontece dele se viciar nele mesmo. O produtor é um cara de fora que vê outras opções. Às vezes um detalhezinho mínimo que ele percebe já vai fazer uma grande diferença não só para a música, mas para a banda toda.

Folha Produtor muda uma banda?

Tomás Não comigo. Eu nunca mandei um artista tocar de tal jeito. Eu só apontei outros caminhos. Quem cria é o próprio artista. Existe o produtor solo, que faz a música inteira para artista, mas esse não é o meu modo de trabalhar.

Folha E se for uma banda fraca e inexperiente, tem como o produtor salvar?

Tomás Não. Quando é assim, não tem jeito. O cara até pode fazer um bom disco, mas não vai ter verdade. O que importa é a verdade do artista. É isso que faz ele crescer ou não. Se o produtor tira essa verdade, ele é o pior produtor do mundo.

Folha O fato de o produtor ser de outra cidade, ter um olhar de fora, pode trazer benefícios?

Tomás Eu não afirmaria isso. O que eu digo é que o produtor deve ser experiente.

Folha Você tem alguma orientação ou conselho para as bandas da cidade?

Tomás Se o artista quiser representar algo para as pessoas, ele tem que criar arte. Não adianta só reproduzir.

Folha Há uma identidade curitibana na música da cidade?

Tomás Eu acho que Curitiba não tem apenas um tipo de musicalidade que possa ser classificada como ''rock curitibano''. A cena da cidade está além disso. É multicultural, que não explode para um lado só, mas para vários lados. Eu acho isso maravilhoso.

> Publicado originalmente na Folha de Londrina de 23-11-2008

Os novos projetos do criador da bossa nova

Aos 78 anos, colega de Dizzy Gillespie e Henry Mancini, o maestro Waltel Branco não se contenta em ser um dos músicos mais respeitados do Brasil

Foto: Letícia Moreira
Waltel Branco quer abrir uma escola de música para as crianças e manda um recado para as universidades: é candidato a professor

Parnanguara de nascimento, o maestro Waltel Branco começou ainda menino a estudar música em Curitiba, somando hoje mais de 70 anos de dedicação a esta arte. Da capital paranaense, levou seu talento para grandes cidades das Américas, onde realizou importantes trabalhos com renomados artistas.

Em Cuba tocou com Perez Prado e Mongo Santamaria. Em Nova York foi músico de Dizzy Gillespie, colega de Henry Mancini e concunhado de Quincy Jones, entre outros consagrados jazzistas. No Rio de Janeiro trabalhou na maior emissora de TV do Brasil por 20 anos, compondo e tocando as trilhas e vinhetas de sua programação. É conhecido de todos os grandes músicos nacionais e é hoje creditado pelos pesquisadores como o verdadeiro criador da bossa nova.

De volta a Curitiba, onde mora nos últimos 15 anos, Waltel saiu do ostracismo e viu seu trabalho de bastidores ser descoberto e reconhecido mundo afora. Com 78 anos, o maestro não pára. Com energia de um menino, afirma que ainda tem projetos para se dedicar até quando chegar aos 120 anos.

Folha de Londrina Seu pai também era maestro. Foi ele quem te iniciou nesta carreira?

Waltel Branco Sim, comecei foi por tradição da família. Ele tocava violão. Daí comecei a tocar violão também. Ele me ensinou. Dali pra frente foi fácil. Depois comecei a tocar bateria pois eu gostava bastante de ritmo. De lá fui pro seminário, onde fiquei dos 13 aos 18 anos estudando violão clássico, órgão, piano, tudo quanto era instrumento.

Folha Do Brasil, o senhor foi morar em Cuba como músico. Como isso aconteceu?

Waltel Quando eu saí do seminário conheci a Lia Ferrel, uma cantora cubana. Comecei a tocar com ela e fui pra Cuba. Lá eu conheci Tito Rodriguez, Perez Prado, Mongo Santamaria. Então fiquei morando em Cuba. Estaria lá até hoje, porque gostava de lá. Mas aí aconteceu do Fidel Castro tomar o poder. E aquela turma com quem eu tocava teve que sair, e eu os acompanhei. Fomos morar em Nova York. Assim como no Brasil, lá pensavam que éramos comunistas e nos associavam com guerra e bagunça.

Folha Mas qual era o problema que o senhor tinha com Fidel Castro?

Waltel O problema era com a minha turma de músicos. Eu e o Fidel somos amigos. Trabalhei com ele, inclusive. Ele é pai de santo de Candomblé. Eu tocava com ele uns instrumentos de percussão. Ele toca paca! Um ritmista e tanto. Hoje eu recebi o e-mail dele sobre a renúncia. Mas eu já sabia que isso ia acontecer.

Folha Como foi o recomeço em Nova York?

Waltel Essa minha turma conhecia o Dizzy Gillespie, que nos chamou pra trabalhar com ele. Foi aí que eu comecei a tocar jazz. Eu estou sempre mudando. Eu também toquei com o Chico Hamilton num grupo de rock blues, bem americano, que leva mais em consideração a música. O rock brasileiro dá mais valor para as letras. Lá também toquei com Marvin Gaye, Net King Cole e o Quincy Jones, que eu chamo de meu concunhado, pois as nossas mulheres são irmãs.

Folha E a parceria com o Henry Mancini, como surgiu?

Waltel Morando lá, fiz um curso de música para cinema, com Anthony Wilson. Lá eu conheci o Henry Mancini, que era meu colega. Ele sabia que eu gostava de dar aula pra crianças, pois as aulas rendem muito mais, a gente aprende com as crianças, que percebem coisas que os adultos não percebem. Ele estava compondo a trilha do filme da Pantera Cor-de-Rosa, que era um cartum famoso, daí ele me contratou pra participar da equipe de arranjadores na firma dele, junto do Barry White e Benny Golson. Nos discos não aparecem os nossos nomes, mas a gente recebe direitos pois estamos nos créditos do filme.

Folha Foi nos Estados Unidos que o senhor conheceu o Roberto Marinho?

Waltel Foi lá mesmo, em 1963. Foi ele quem me trouxe para o Rio, me convidou para trabalhar na televisão que ele ia fundar. Mas chegando lá, eu entrei para o jornal O Globo, onde fiquei escrevendo enquanto a emissora de tv não começava.

Folha Quer dizer que o senhor também foi jornalista?

Waltel Fui sim. Tenho até carteirinha. Sou crítico de música. Até hoje eu ainda escrevo para o jornal, quando o Edvaldo Pacote me pede. Ele é vice-presidente do grupo, e me pede músicas também. Umas trilhas e vinhetas.

Folha Muita gente não sabia que o senhor ainda trabalha na Globo, afinal o senhor saiu de lá há anos e ainda processou a emissora...

Waltel Eu briguei e ganhei. Eles não queriam pagar meus direitos autorais, dizendo que eu não tinha direito algum. Abri uma ação contra eles. A coisa foi longe mas eu ganhei. Mas até hoje quando eles precisam, eu ainda faço trabalhos sim. Afinal os meus amigos ficaram todos lá (risos).

Folha O senhor é hoje apontado como o verdadeiro criador da bossa nova...

Waltel É, eu fiz a bossa nova. Na época, eu e o João Gilberto dividíamos um apartamento na pensão de Dona Tereza. O João antes era cantor de ópera, tinha um vozeirão, depois mudou de estilo pra cantar baixinho. A gente ficava estudando música. Daí surgiu o ritmo, que pegou, especialmente nos Estados Unidos. Mas a bossa nova já existia antes. Laurindo de Almeida e vários outros cantores já tocavam daquele jeito na década de 30.

Folha Como foi a volta para Curitiba? Por que o senhor voltou?

Waltel Eu voltei a convite da Alice Ruiz, que na época era secretária da Cultura de Curitiba. Ela me chamou para dar aula no Conservatório de MPB. E fiquei. Voltei a tocar com o Gebrant, com quem eu já tocava antes de ir pro exterior.

Folha E hoje, o senhor ainda ensina música na cidade?

Waltel Eu já quis fazer um curso de música, mas em Curitiba é difícil. Aqui ainda existe muito pensamento de colônia. As universidades levam muito em consideração o prestígio e a origem da família na hora de contratar professor. O cara pode não saber nada, mas se for de família nobre pode dar aula. E olha que eu sou nobre também. Sou primo do Comendador Araújo. O Paulo Leminski é meu primo-irmão, filho da irmã da minha mãe. Mas as universidades não sabem disso, eles pensam que sou músico vagabundo de rua (risos).

Folha Nos últimos cinco anos houve uma redescoberta do seu trabalho. Comente esse episódio.

Waltel Eu nunca pensei que meu trabalho fosse repercutir entre o público, eu fazia porque gostava. Acabou que hoje o meu disco ''Meu Balanço'' é muito procurado por DJs, é um dos LPs mais caros do mercado. Agora o Claudio Menandro pegou mais de cem músicas minhas para gravar, e no ano passado a cantora grega Eva Fampas gravou quatro músicas minhas no álbum ''Capriccio Diabolico''. Acho até que vou morar na Inglaterra, pois o Brasil não me dá bola.

Folha Um artigo do livro ''A Desconstrução da Música na Cultura Paranaense'' cita que o senhor tem projetos para até quando completar 100 anos. Quais estes projetos?

Waltel Ih! Agora já aumentou pra 120 anos (risos). Eu quero fazer um disco de músicas para crianças, gravar discos com as minhas músicas que ninguém quer tocar por achar difíceis, e abrir minha escola de aula de música para crianças. É isso que eu quero.

> Publicado originalmente na Folha de Londrina de 22-02-2008

Tim Festival em versão mais concentrada

Novo formato contou com uma grade mais integrada para contemplar todas as atrações

Gogol Bordello e o carismático vocalista Eugene Hutz: melhor show do evento

Dan Deacon: som eletrônico animou o público

Neste ano, o Tim Festival não se expandiu para o Paraná, como nas duas últimas edições, que arrastaram grandes públicos para a Pedreira Paulo Leminski, em Curitiba. Segundo dados oficiais, a produção decidiu ''concentrar esforços na edição paulista, cujo novo formato teve uma configuração mais próxima à do Rio, com uma grade integrada e contemplando todas as atrações''. Além das metrópoles, houve uma versão reduzida em Vitória (ES), que foi possibilitada justamente por ser de pequeno porte.

Corre por fora a informação de que esta concentração de atenções nas capitais do eixo seria tomada para minimizar possíveis incidentes que marcaram a edição do ano passado, como problemas técnicos e grandes atrasos. A julgar pelo que foi visto em São Paulo - pela proximidade, a praça escolhida pelo público paranaense interessado em ver os shows -, valeu a pena. Não houve grandes atrasos (quando havia, era de meia hora, dentro da normalidade de eventos como este) nem problemas técnicos gritantes.

A curadoria centrou-se em nomes menos conhecidos da música pop, com exceção do rapper Kanye West, que abriu na quarta-feira as atividades da Arena do Parque Ibirapuera, o palco pop. Com produção faraônica, o show dividiu opiniões. A quinta-feira, marcada pelos cancelamentos (The Gossip na arena e Paul Weller no auditório), trouxe animação apenas no show do Klaxons, que transformou a arena em pista de dança. Conhecidos como o maior nome da new rave, o grupo mostrou que o termo é uma falácia criada pela mídia musical. O Klaxons é um bom grupo de indie rock dançante com referência nos anos 80, e só. No auditório, muitos assentos estavam vagos devido à derrocada dos fãs de Paul Weller, substituído por Roberta Sá e Arnaldo Antunes. Marcelo Camelo fez sua estréia solo na capital paulista, mas não encontrou o público fanático que geralmente é visto em suas apresentações.

Na sexta-feira, o povo estava animado, dentro do clima do festival. No Auditório, uma platéia mais velha vibrava com as apresentações virtuosas dos jazzistas Tomaz Stanko, Enrico Pieranuzi e Bill Frisell. Na Arena, Junior Boys abriu sem empolgação. O eletrônico Dan Deacon tocou no meio do público, agitando a moçada. O melhor show, não só da noite, mas do festival, foi o do Gogol Bordello, combo multiétnico liderado pelo carismático e frenético Eugene Hutz. Sabendo como incendiar um público, começaram com músicas mais punk, para mais tarde executar as que têm sonoridades mais folclóricas. Os DJs Switch e Yoda tocaram em seguida.

O encerramento, no sábado, teve um clima mais sóbrio. Rosa Passos fazia uma bela retrospectiva de sua carreira no auditório. Na Arena, o Cérebro Eletrônico fez um mix de Mutantes com rock atual. The National realizou um show maduro e de boa qualidade, que evocava o clima soturno de Joy Division, mas com simpatia. Já o MGMT foi pura imaturidade, tanto visual quanto sonoramente. Era decepcionante ver um grupo com um disco tão bom fazer um show tão largado.

É notável lembrar do show gratuito que o lendário saxofonista Sonny Rollins realizou na manhã de sábado no Parque do Ibirapuera para uma multidão formada pelos mais variados tipos de públicos. Esta extensão com a comunidade foi um dos pontos mais marcantes da edição deste ano do Tim Festival.

O jornalista viajou a convite do festival.

> Publicado originalmente na Folha de Londrina de 28-10-2008

U2 vai do pop ao introspectivo em novo CD

Novo trabalho da banda está disponível também em uma edição limitada de luxo

Após cinco anos sem lançar um álbum novo, o U2 trouxe à luz ''No Line On The Horizon'', que chegou às prateleiras na primeira semana do mês e desde então não saiu do topo da lista de mais vendidos.

A fidelidade dos fãs impulsiona as vendas. Não são poucos os que veem o vocalista Bono Vox como uma espécie de Messias, seja pelo conteúdo das letras que escreve ou pelo discurso de comprometimento com o planeta (no encarte há endereços para quem quiser se filiar a instituições apoiadas pelo grupo, como Greenpeace e Anistia Internacional).

Por falar em messianismo, esse disco apresenta um caráter espiritual forte. Há um tom de louvor nos vocais de Bono (notável na faixa título, que abre o disco), assim como na atmosfera do trabalho, com algumas letras que citam passagens bíblicas, como em ''Magnificent'' e ''Unknown Caller'', presentes na primeira metade do álbum, que tem uma roupagem mais séria e contemplativa, remetendo à fase oitentista do grupo.

A partir da segunda metade, o disco ganha outros contornos. ''Get On Your Boots'' (a primeira música de trabalho) e ''Stand Up Comedy'' são dançáveis e grudentas, próximas do U2 dos anos 90. Já com a experimental ''Fez - Being Born'' inicia-se outro ciclo no disco, com músicas introspectivas e cheias de ambiências. Nisso, houve uma grande contribuição dos produtores Danny Lanois e Brian Eno, responsáveis pelos sintetizadores, programações e outros recursos de estúdio que casaram de forma exata (e sem excessos) com o rock do U2.

''No Line On The Horizon'' está disponível também em uma edição limitada de luxo, com um bonito estojo em papel cartão, encarte de 32 páginas, pôster e acesso a um vídeo exclusivo.

Serviço:
- No Line On The Horizon - do U2 custa R$ 34,90. A edição limitada de luxo custa R$ 44,90

> Publicado originalmente na Folha de Londrina em 26-03-2009

Som na Caixa: Dead Fish - ''Contra Todos''

Hardcore furioso

Em seus 18 anos de existência, os capixabas do Dead Fish passaram o período mais recente de sua trajetória morando em São Paulo. Este talvez seja o motivo que faça seu novo álbum soar tão rápido, pesado e direto. Ao mesmo tempo em que resgata a energia do começo do grupo, ''Contra Todos'' (lançado pela Deck Disk) também soa como o trabalho mais maduro lançado até então.

Com apenas uma guitarra devido à saída de Hóspede, a sonoridade está mais crua no atual formato quarteto, composto por Rodrigo (vocais), Nô (baterista que deixou a banda antes de lançar esse disco, sendo substituído por Marcão), Alyand (baixo) e Phillippe (guitarra). Esta crueza é refletida também na arte do álbum, inspirada na linguagem dos fanzines, veículos de comunicação independentes que tanto ajudaram a divulgar o trabalho da banda pelo Brasil afora.

Sem se deixar levar pelos modismos do hardcore atual (em que letras melosas e histórias de fracassos amorosos imperam), o Dead Fish se mantém fiel ao discurso de protesto, cheio de palavras de ordem, a começar pelos nomes de algumas músicas, como ''Venceremos'', ''O Melhor Exemplo do que Não Seguir'' e ''Armadilhas Verbais''. Esta característica se manteve inalterada mesmo com a contratação do grupo por uma grande gravadora, em 2004.

Seu hardcore ao mesmo tempo que é melódico, é também brutal e pancada. As letras em português (com exceção de ''Shark Attack'') se encaixam perfeitamente à massa sonora pesada, e isso poucas bandas do gênero conseguiram no Brasil. Neste quesito, o Dead Fish fez um belo trabalho de antropofagia, transformando um estilo musical californiano em algo próprio deles.

> Publicado originalmente na Folha de Londrina em 04-03-2009

Som na Caixa: Vander Lee - "Faro"

Ecos dos barzinhos enfumaçados

De seus primeiros dez anos de carreira musical, quando trabalhava como músico de bar, o cantor mineiro Vander Lee trouxe para os álbuns de estúdio as influências de importantes nomes da MPB, que constantemente faziam parte de seu repertório. Neste sexto disco, ''Faro'' (DeckDisc), a escola como intérprete ecoa em um bom número de composições próprias.

A faixa de abertura ''Eu e Ela'', por exemplo, remete ao conterrâneo Milton Nascimento. ''Baile dos Anjos'' lembra Chico Buarque na maneira de cantar. Já ''Fui'' é Djavan puro, enquanto ''Farol'' traz lembranças de João Gilberto. Em meio a tantas referências, o cantor imprime um estilo mais peculiar de cantar na afro-brasileira ''Do Bão'', na suingada ''Nega Nagô'' e na jazzística ''Nunca Não''.

Se no canto Vander Lee não se desvencilha de seus mestres, nas letras ele mostra um trabalho autoral mais forte e com personalidade própria. Tanto que já teve composições gravadas por cantoras como Elza Soares, Gal Costa e Emilinha Borba. Ainda assim, ele não dispensa duas covers: ''Ninguém Vai Tirar Você de Mim'' (de Roberto Carlos, em versão black com participação do rapper Renegado) e ''Obscuridade'' (não exatamente uma cover, mas um poema musicado de Cartola, que é a cereja do bolo desse disco).

> Publicado originalmente na Folha de Londrina em 22-04-2009

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Som na Caixa: Beijo AA Força - "Beijo AA Força Ao Vivo"


Clássico do rock curitibano

No último sábado completou-se um ano que a banda Beijo AA Força, ícone do punk curitibano, encerrou suas atividades após quase 25 anos em um show antológico que reuniu entre o público figurinhas carimbadas da velha guarda do rock local ''botoxeados e lipoaspirados'', como brincava o vocalista Rodrigo Barros ao microfone.

Na ocasião era lançado seu último álbum, ''Beijo AA Força Ao Vivo'', um item de despedida que registrava algumas de suas melhores músicas, aditivadas com energia de palco. Ainda disponível para venda, o álbum valoriza composições feitas em parceria com Marcos Prado, dono da alcunha de ''poeta maldito'', que faleceu vítima do consumo excessivo de álcool, mesmo fim que tiveram outros boêmios ilustres de Curitiba, como Paulo Leminski e China Meneghetti (este, morto no último domingo).

Sérgio Viralobos e Thadeu Wojciechowski também estão entre as parcerias da banda, que sempre valorizou a poesia marginal e nunca teve receio em juntar samba a seu rock (antes mesmo da fórmula virar moda na década de 90). Nos últimos anos de sua carreira, continuaram a misturar: no show em que foi gravado este álbum, além da sonoridade obrigatória do triunvirato guitarra-baixo-e-bateria, havia participação de um tecladista e de um DJ, enriquecendo ainda mais a parte instrumental.

''Síndrome de D. Juan'', ''Se o Marcos Prado Fosse James Joyce'' e ''Diário de um Palestino'' são algumas das grandes canções do disco, que inclui também o clássico da banda, ''Homem de Ferro'', com toda certeza uma das melhores músicas do rock curitibano, com uma letra sempre atual.

Há uma versão do disco que vem com um DVD-R com três músicas, sendo um videoclipe e duas filmagens ao vivo. Também está disponível o CD ''Companhia de Energia Elétrica Beijo AA Força'', lançado em 2003, em comemoração aos 20 anos da banda.

Serviço: O CD pode ser adquirido a R$ 10 através do e-mail chefatura@gmail.com

> Publicado originalmente na Folha de Londrina em 26-03-2008